terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Momento de renovação

"Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí, entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número, e outra vontade de acreditar que daqui para diante vai ser diferente". Carlos Drummond de Andrade

Nesse período do ano é normal fazermos reflexões sobre o que passou e sobre o que estar por vir. Hora de fazer o balanço do ano que termina e de listar as resoluções para “o ano que vai nascer”.

Antes de pensarmos no conteúdo para o Ano Novo, olhamos para trás pra verificar o que ficou em aberto na lista anterior. Alguns itens, nem de longe, foram cumpridos. Fatos nos levaram a mudar de rota completamente e, agora, na hora de fechamento, premidos pelo espírito da renovação, tais itens entrarão na lista que está prestes a ser confeccionada. Muito legítimo isso. Afinal, a vida é um eterno recomeço.

Entre planos de emagrecer, frequentar a academia, fazer pilates, retomar as aulas de inglês, fazer MBA, trocar de carro, existem aqueles que estão em outro patamar, que dizem respeito, por exemplo, à espiritualidade ou à forma com que você se relaciona com as pessoas.

É sempre bom começar o ano imbuído do desejo de ter uma relação mais próxima com Deus e, em contrapartida, se afastar dos apelos consumistas vigentes na sociedade moderna. Alimentar a alma é fundamental...

No plano das relações, às vezes, se posicionar não é tão simples. Isso porque aqui, há que se contemplar o outro.

Lembro-me de que há poucos anos, desiludida talvez com a falta de compromisso das pessoas, algo tão comum nos dias de hoje, escrevi: “só darei bola para aqueles que forem capazes de retribuir a atenção recebida”. Não sei o que houve, mas, a partir do momento em que adotei essa premissa como norte para as minhas relações pessoais, a vida ficou mais leve.

Relacionar-se com as pessoas esperando que haja por parte delas um comprometimento que, na realidade, não há, só nos traz sofrimento. A reciprocidade é pressuposto para qualquer relacionamento. Se não há isso, não há como prosseguir adiante.

Se o ônus de sustentar uma relação de amizade cabe tão somente a você, sinto muito, mas isso não é amizade. Relações assim precisam ser expurgadas da nossa vida. Por que insistir em algo que só nos dá decepções e aborrecimentos?

Purificar esse lado da vida também é importante. Às vezes, é preciso virar as costas para algo supostamente significativo e seguir adiante, ainda que seja necessário se trancar na própria vida numa espécie de alienação egoísta – que, aos poucos, será, sem dúvida, até prazerosa.

Não sei, mas, à medida que o tempo passa, percebo que “a gente vive mesmo é para se desiludir e desmisturar” (Guimarães Rosa em Grandes Sertões Veredas). Só nos resta, pois, coragem para nos distanciarmos do que não nos faz bem. Creio que sempre vale a pena!

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Detalhes tão pequenos... fazem a diferença

Escutei a narrativa de um jovem brasileiro, desencantado com a interpelação feita por um transeunte francês que, ao ser indagado acerca da exata direção a tomar para chegar a determinado destino, retrucou, de chofre: “ -Premiére, on dit bonjour”.

É claro que os conterrâneos de Napoleão Bonaparte não podem ser considerados um primor em termos de educação. Pelo contrário, o mundo é uníssono ao propalar a grosseria do povo francês, mais especificamente dos parisienses, os quais lastreiam tal comportamento na justificativa de que os milhares de turistas que lá aportam levam-os a agir com certa impaciência.

Tal episódio, no entanto, me fez refletir sobre o quanto estamos nos distanciando de hábitos que deveriam fazer parte do nosso dia a dia. Passar ao largo das boas regras de convívio social é trivial nos dias de hoje. Em nome do pragmatismo, opta-se pela objetividade e, sem que se perceba, abre-se mão da gentileza.

Lembro-me de que, há tempos atrás, era corriqueiro ensinar algumas palavras mágicas às nossas crianças: bom dia, obrigado, por favor, com licença, desculpe...

Parece-me, todavia, que a roda viva em que estamos mergulhados fez com que tais delicadezas caíssem no esquecimento. Escudados no stress – que a tudo justifica – cada dia entronizamos comportamentos que, automatizados, fazem parte de uma rotina que, em outras épocas – nem tão distantes assim – seriam execrados.

Ser rude virou lugar comum...

Cumprimentar o porteiro, o companheiro de elevador, dar passagem no trânsito, ficar atento ao pedestre, tratar com deferência as pessoas mais velhas, ser pontual, saber ouvir, entre muitas outras coisas, são atitudes cada vez mais raras.

Afinal, estamos todos cansados e, porque não dizer, ansiosos, deprimidos, melancólicos, padecendo de carências afetivas ou de uma síndrome qualquer entre tantas que existem por aí.

E assim seguimos adiante - desbussolados - sem sabermos ao certo pra onde ir e sem nos darmos conta de que a força contida em nossas mais delicadas e íntegras ações é que fazem a diferença.